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TextoI


A soberba azul e a soberania da areia

                                                              Ariana Quintiliano 

Extraordinária cena.

Havia muito tempo que não observava aquela bela paisagem. Parecia que o paraíso estava ali, tão perto de mim, e eu o recusava. Era de uma beleza impressionante ver o pôr-do-sol surgindo por uma força mágica e tão divina. Por alguns instantes, comecei a refletir e apreciar aquele momento que me chamava atenção.

As ondas vinham e iam numa agilidade fantástica. Tive inveja delas, pois sabem até onde podem desbravar. Sabiam que nos dias de ressaca, explorariam e marcariam aquelas finas areias, deixariam ali sua marca de rebeldia. Às vezes, vivia numa “ressaca” incontrolável, queria ferir e deixar minha fúria marcada em alguns “grãos de areia”, de certa forma, conseguia.

Passava a caminhar sobre os barulhos das ondas que eram como um grito, soando fundo no meu interior.  Talvez estivessem falando comigo e para chamar minha atenção, cobriam meus pés com suas espumas brancas. Meu pouco tempo não permitia observá-las, e isso me fazia sentir tão pequena diante aquela sensacional visão. Os anseios que carregava naquelas horas, deixavam-me menor ainda, diante o infinito mar. Nunca pensei que ele daria respostas, mas naquele momento eu as recebi.

Os sons das ondas eram misturas de vozes que penetravam nos meus ouvidos e a maresia adentrava minhas narinas, corria no meu sangue, domava meu ser. Até desvendar, sucessivamente, o véu que cobriu meus olhos durante muito tempo.

Sentia-me um grão de areia, indefeso, no meio de muitos outros grãos, cada um com sua importância, mas estavam ali. Talvez perdidos, solitários, vagando nos pensamentos ou relaxando a mente para mais uma jornada cotidiana. As ondas quando vem, levam muitos deles para o fundo do oceano. Quem sabe fosse lá o final de uma luta ou o recomeço de uma grande batalha.

Na extraordinária cena, percebi que a natureza nos contemplou com o imenso azul: o céu, o mar. Na certa ela quer que entendamos que somos pequenos diante dela. No mar se vê os pequeninos grãos de areia, mas do céu eles são invisíveis.

 

TEXTO II             

Para a eternidade

 

O relógio já soava dezenove horas. O tique-taque era constante, mas nada de Álvaro chegar. Aquela noite começava a ficar agitada. Emília olhava para o relógio e para a janela ao mesmo tempo. Os pensamentos passaram a borbulharem na cabeça: “com quem ele está? Por que ainda não chegou?” “Será que aconteceu alguma coisa?”

 

A noite passava é já eram mais de vinte horas. O telefone desligado, expediente de trabalho encerrado. “Não estava na mãe”. “Onde se encontrava naquelas horas tensas?”

 

Não deram dez minutos Emília ouviu o barulho da maçaneta da porta. Correu para encontrar com Álvaro, porém era Elizete, a filha mais velha. O olhar deveria se alegrar com a presença da filha, mas ficou triste e cabisbaixa. A moça apenas cumprimentou a mãe e subiu para o quarto.

 

Novamente, aqueles malditos pensamentos. A cabeça era dominada por centenas de devaneios que só se cessariam se Álvaro surgisse pela porta.

 

Emília cansou de esperar e foi para o quarto. Olhava as fotos na cabeceira da cama. Todas pareciam às favoritas, talvez, por isso estavam ali espalhadas pelo quarto: cabeceira, cômodas e paredes.

 

De repente, Emília ouviu o barulho do chuveiro, correu até o banheiro. Ali viu os chinelos de Álvaro. “Ele chegou!” – pensou Emília.  Ao abrir o box, viu apenas o chuveiro ligado, desperdiçando água e energia elétrica. Emília desligou o objeto e sentou-se na cama. Relembrou de quando conheceu Álvaro. Os beijos, as caricias, as juras de amor e do “sim”, diante do padre, na noite de seu casamento. Cada foto ali no quarto representava um acontecimento alegre do casal. Depois de recordar esses acontecimentos lembrou-se que ela mesma ligara o chuveiro e esqueceu-se de desligá-lo e que calçava os chinelos do marido sempre que saia do banho. Passaram alguns segundo, Elizete surgiu no quarto, perguntava se a mãe estava bem. Entretanto, os olhos da progenitora diziam que não, pois estavam lacrimejados, prontos para jorrarem as muitas lágrimas presas naquele espelho profundo.

 

Elizete segurou as mãos de Emília e choraram juntas. Álvaro jamais voltaria... 

                                                           (Os textos são de minha autoria: Ariana Quintiliano/ direitos reservados)